Existo
- Noto a forma como me olha, Drª Muriel. Noto o total desprezo no qual os seus olhos estão totalmente mergulhados ao analisar a minha inexistência. Sim, eu sei que sou complexo o bastante para travar sua mente, o que é perfeitamente compreensível, pelo menos para mim. Há muito me afastei do que me tornava humano, por assim dizer. Mas pensando melhor, creio que aquilo que me ligava à humanidade resolveu me abandonar. Não adianta tentar esconder o espanto, Drª, sei que não sou algo que você está acostumada a registrar em seus relatórios. Não precisa temer. Você está completamente segura, não por causa do invólucro no qual estou contido, mas por que não tenho interesse em poupá-la dessa vida patética que vocês, humanos, levam; acordando sempre na mesma faixa de horário, mantendo uma rotina doentia com a simples e única justificativa de receber uma quantia qualquer para poder pagar por aquilo de que não precisam realmente. - Drª Muriel, sabia que nem sempre fui assim? - Conte-me, senhor.